O
dia mal havia começado. Na mesa cirúrgica, um menino de dois meses precisa ser
operado para corrigir uma hérnia epigástrica e outra inguinal. Cirurgias
relativamente simples, mas que pela idade da criança, precisavam de certos cuidados
em relação ao procedimento anestésico. Despercebida das coisas, aquela criança,
muito branca, olhos claros, cabelos loiros e ralos, deixava escapar, no olhar
inocente, a alegria de ser muito bem cuidada e amada pelos pais.
O cirurgião e seu auxiliar entraram na
sala. Acabavam de cumprir o ritual da lavagem das mãos que precede o ato
operatório. Sem tocar em nada que os circundava, vestiram os capotes cirúrgicos
e aproximam-se da criança já anestesiada.
– Podemos começar? – Indagou-me o cirurgião, cumprindo
mais uma parte do ritual anestésico-cirúrgico.
Fiz um sinal de positivo com o polegar permitindo que
o bisturi desvendasse segredos daquele corpo inocente. Passados alguns minutos,
com um sorriso zombeteiro, o cirurgião dirigiu-me a palavra:
– Eu sei das tuas convicções religiosas, mas aqui para
nós, de vez em quando, não dás uma fugidinha de casa com alguma garota bonita?
Não era a primeira vez que ele fazia esse tipo de
provocação. Limitei-me a um sorriso. Ele insistiu:
– Vais dizer que resistes a todas as tentações? És
santo por acaso?
A ironia com que disse essas palavras, fez com que
toda equipe cirúrgica se pusesse a rir. Continuei em silêncio, concentrado nos
sinais vitais do pequeno paciente. Aquele coraçãozinho havia aumentado a
frequência dos batimentos e precisava de cuidados.
– Amigo, – retruquei após algum tempo – Se não fazes
as coisas certas por amor a Deus, responde-me sinceramente, baseado apenas na
razão. Vale à pena sair com uma garota bonita, correr o risco de contrair uma
doença, contaminar a esposa, destruir a paz no lar e a felicidade dos filhos?
Acho que só é válido isso – complementei enfático – quando se tem uma família
que vale muito pouco.
O sorriso de galhofa desapareceu do ar. Cirurgião e
auxiliar entreolharam-se talvez procurando uma resposta inexistente.
O silêncio voltou à sala de cirurgia. Fiquei meditando
por algum tempo. Por que, quando servimos a Deus, a alegria que sentimos por
servi-Lo incomoda outras pessoas? Por que, até mesmo fulanos inteligentes,
privilegiados, procuram zombar, ridicularizar aqueles que se deleitam com o
amor de Deus?
Algumas pessoas sentem-se como deuses ao abrirem com a
lâmina pagã de um bisturi silente, o corpo sagrado de um ser que foi criado,
como todos nós, à imagem e semelhança de Deus. Talvez, por “brincarem de deus”
na tentativa de restituir a saúde a alguém, sintam a necessidade de serem
bajuladas, ou quem sabe, também adoradas como pretenderam, outrora, alguns
anjos que decaíram.
O amor do Deus verdadeiro traz felicidade. É um amor que
completa e conforta. Onde está o deus que buscas para que sejas feliz? No teu
trabalho? Na tua habilidade em manusear um bisturi? No teu comércio que aumenta
tua conta bancária? Apenas nas tuas palavras que se perdem ao vento?
O Deus verdadeiro,
esse que nos dá alegria ao servi-Lo, está em toda parte... Basta reconhecê-Lo
como senhor absoluto de todas as coisas. Para amá-Lo verdadeiramente, devemos
seguir simplesmente seus ensinamentos, seguir suas palavras que compõem a
Bíblia.
A verdade é que o amor de Deus é grande o suficiente
para fazer feliz a todos que o desejarem. É só buscar.
Pr.
Antonio Jorge
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